Formação gaúcha mostra sem surpresas o porquê de ser um dos expoentes do metal brasileiro no mundo
Por Luiz Athayde
A classe de 2022 caminha para seu desfecho e, a fim de evitar que algum incauto não ouça Me7amorphosis, o álbum para lá de novo da banda Hibria, lhes trago algumas considerações.
Antes de mais nada, é bom frisar que o Musical Fortress segue a linha Massariana: de indicações sônicas. Quem acompanhou a MTV nos anos 90 sabe a importância estelar que Fabio Massari teve à frente de programas como o Lado B, ao apresentar raridades da esfera alternativa a um público cru, mas sedento por novidades.
Só que o lance aqui é heavy metal e está londe de ser uma raridade. Formada em 1996 na cidade de Porto Alegre, o guitarrista e compositor Abel Camargo é o único membro original. Por outro lado, seus méritos neste contexto não cabem no gibi. E isso inclui desde existir como banda de metal em um país como o Brasil, e com uma cobertura midiática selecionada ao que se convencionou a ser chamado de medalhão – o céu é o limite para os canais de fofoca.
Outro ponto inegável se trata da sua capacidade de manter os ex-integrantes dentro do círculo do Hibria, indo além da diplomacia, ou seja, amizade mesmo. Algo raríssimo em qualquer banda, independente de estilo.
E o que isso tem a ver com novo lançamento? Bom, tudo. Alterações no line-up sempre foram uma constante na banda, mas há alguns anos houveram mudanças mais bruscas, inclusive culminando na saída de Iuri Sanson. E todos sabemos que escolher um vocalista não é trabalho para amadores. Afinal, estamos falando da voz original, que voou junto com o grupo para outros territórios, incluindo debut na China e sendo uma das pratas da casa no Japão, com direito a disco ao vivo e DVD.
Mas tudo foi dando certo. E como: em 2018, o vocalista Victor Emeka (Soulspell) entra na banda, seguido pelo baterista Otávio Quiroga, o guitarrista Bruno Godinho (que sairia para a entrada de Vicente Telles) e o baixista Thiago Baumgarten. Até aí, a preocupação ainda era latente entre os fãs, com dúvidas girando em torno do futuro, especialmente discográfico, de quem soltou registros como Defying the Rules (2004) e Blind Ride (2011).
Me7amorphosis saiu sob chancela do carimbo japonês Avalon e contou com um time interno de peso nos trabalhos de produção, mixagem e masterização. O som pesado e extretamente nítido é graças aos esforços de Bruno Godinho, Benhur Lima e Mike Couzzi (EUA). Embora tenha, naturalmente, Abel Camargo como produtor executivo.
O disco traz o formato tradicional dos discos clássicos (e candidatos a tal); 10 músicas inspiradas, cuidadosamente trabalhadas, mas sobretudo empolgantes. “War Cry” abre como um hit pronto, e mostrando sem meias palavras o poderio vocal de Emeka. “Shine” aponta a sempre instigante faceta power/speed metal da banda. Não à toa, traz a participação do ex-guitarrista Renato Osório brilhando no solo.
Na sequência, a belíssima balada “Meaning of Life” ilumina o álbum que na verdade mal começou. Sobram conexões indiretas com com o viés radiofônico do início dos anos 90, a exemplo de nomes como Firehouse e Tesla. O solo de guitarra em seu desfecho é assinado por Diego Kasper (também ex-Hibria), e emociona. Sucesso à vista.
A introdução eletrônica de “Fearless Will” denota uma certa pegada progressiva, quando na verdade apresenta ecos de discos que projetaram o Hibria para além-mar. Cortesia da cozinha, trabalhando de forma tão rápida e coesa quanto um buffet às vésperas de um casamento.
Já “I Am So Lonely” simplesmente quebra tudo e nos faz imaginar vagamente o que seria de um encontro no palco entre o Rush de Test For Echo e a era de ouro do Pantera. Porque aqui não bastou ser pesado; o refrão se mostra parte fundamental nesta faixa e também no conjunto da obra. “Raging Machine” vem no engate e evita que o ouvinte descanse por um segundo; speed, heavy, metal. E prog. Fórmula difícil de sair errada, especialmente com um line-up desse quilate.
Sabe aquele dinamismo presente em Blind Ride? Pois bem, “Skyline of the Soul” carrega isso e mais um pouco, e inconscientemente enterra qualquer possibilidade apreensão se o novo Hibria daria conta do recado. Faixa tão potente quanto qualquer outra de sua discografia. Em “The Racer” o título já diz tudo, assim como pede uma pegada mais ‘pra frente’. Seu mote segue pela via do heavy metal tradicional, embora o grupo engate a 7ª marcha na hora do solo.
Quase no fim, Diego, Renato e ninguém menos que Iuri fazem uma visita à casa e dão mais que um alô. “Tribal Mark” é o atestado de uma marca que veio para ficar. Completando a metamorfose, “A Storm to Heal” aparece da mesma forma que a primeira faixa: melódica, mas imponente; e dona de riffs feitos para grudar. Ainda há uma “baixaria” ali no meio, com Thiago Baumgarten dizendo que o instrumento é essencial, e também pode ser visível sem ser pretensioso em uma composição.
A parte visual – arte, videoclipes dos singles – leva a assinatura de Victor Emeka, que é publicitário. E como um bom álbum pede uma boa capa, até nisso a banda soube explorar. No entanto, Me7amorphosis ultrapassa a barreira imaginária que existe entre novos itens e peças de cabeceira.
Mais que um disco de renovação em todos os sentidos, a sétima fotografia do Hibria integra com facilidade os melhores ábuns do ano, e de seu catálogo. Além de automaticamente ser um candidato a clássico. Obrigatório.
Ouça Me7amorphosis na íntegra a seguir:
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