O Metal Melódico sobreviverá até a metade do século XXI? Icon Of Sin pode responder
Por Márcio Heleno
Antes de tudo, preciso ressaltar um detalhe nesta análise tão suave quanto um jumbo na Marginal Tietê: este texto foi escrito por um humano que não é apaixonado por metal melódico. Sim. Não sou amante do estilo. Nunca fui.
Sou amante, sem nenhuma vergonha, da newwave dos anos 80 e sem medo de dizer: me apaixonei pelo grunge, trazendo a crueza do rock novamente e também afeito ao new metal no final dos anos 90. Julguem-me!
Sempre deu a ligeira impressão de estar ouvindo uma mesma música sempre, independente do álbum, dos artistas e do ano. E é fato: o metal melódico, essa vertente do metal, é uma miscelânea de lugares-comuns embora tenha um mundo interno de castelos, de guerreiros, princesas, magos e dragões. Isso sem falar na duração das músicas.
Mas este fato não impede de reconhecer grandes obras do meio. Inclusive, grandes músicos deste estilo me ajudaram a montar meu vocabulário musical. Desde Nicko McBrain até Aquiles Priester. Impossível não haver reconhecimento.
Não ser fã não significa deixar de reconhecer ou não admitir que boa parte da técnica musical de excelentes músicos vieram deste estilo. Pelo contrário, é fora da paixão do fanático que é possível enxergar racionalmente a obra.
Há um grupo desta vertente que me chamou atenção: Icon Of Sin. É esta banda de Curitiba-PR que tem causado uma certa “movimentação” na Internet. Mais pro bem do que para o mal.
E isso se dá, principalmente, pelo fato de seu vocalista, Raphael Mendes, ser conhecido nas redes sociais com seu trabalho de “covers” de Bruce Dickinson. Sim. Ele realmente tem um timbre vocal que se assemelha ao dono da voz da donzela de ferro inglesa, e é muito popular no YouTube gravando vídeos de como seriam algumas músicas ao som do timbre de Dickinson.
Muitos dos críticos e dos ouvintes se apegam ao fato da semelhança vocal dos cantores sem se dar conta da carga musical além das vozes que há no projeto.
Neste segundo álbum via Frontiers Records, intitulado Legends, o que me deixou intrigado é uma espécie de novo formato. Ao menos, uma tentativa de misturas de subgêneros. E o único aspecto que o grupo tem em sintonia com Iron Maiden é, de fato, o timbre das vozes.
No entanto, senti um certo alívio. Na minha opinião, o único álbum que se destacou por fazer algo diferente, interessante e, por isso mesmo, se configura como um clássico dentre bandas nacionais e estrangeiras do estilo foi o álbum Temple of Shadows, do Angra.
Em Legends, o Icon Of Sin não repete o “abrasileiramento” musical feito em “Temple…”, mas traz um frescor que muitas bandas americanas e europeias poderiam se situar:
– Faixas com tempo de duração palpável, o que torna o álbum agradável e longe de ser “mais do mesmo”;
– Há elementos de hard rock por todo álbum. É o frescor de poder se deleitar, ou melhor, “degustar” um bom riff de guitarra acompanhado de uma bela cozinha rítmica – groove (no baixo, Caio Vidal – virtuoso! Nas baquetas, o impressionante Markos Franzmann).
– Groove, ritmo, força e potência, sem parecer ser uma máquina repetidora;
– Suítes progressivas de bom gosto! Ouvir bandas de metal progressivo, para alguns, chega a ser uma luta ou uma tortura, de tanta “fritação” das técnicas de seus excelentes músicos. Icon Of Sin não é um grupo de progressive metal, porém, soube usar a técnica na hora certa e na medida certa transformando o trabalho, não em uma batalha auditiva reservada somente aos amantes do estilo, mas numa odisseia, numa gostosa expectativa onde esperamos a hora em que os músicos mostrarão a técnica no ponto ideal.
“Cimmerian”, é mais hard rock do que se julgava nossa vã ideia de metal e isso é um elogio! Também destaco aqui a faixa “In The Mouth of Madness”, onde a tradicional “galopada” do metal melódico está aqui – o riff de guitarra na entrada do vocal –, uma sensação de ponto e vírgula que faz a melodia ficar mais interessante. É o tal “respiro”, a importância dada ao groove.
Esses detalhes fazem a diferença. Aliás, são os mesmos que poderão trazer oxigênio ao gênero. O solo de “In The Mouth…” mostra um duelo maravilhoso das duas guitarras (Marcelo Gelbcke e Sol Perez – debulhando em todo álbum o melhor de suas técnicas) ardendo.
Comparações com Iron Maiden acabam quando começam as intrínsecas partes de bateria e baixo na faixa “The Scarllet Gospels”. Ou, “Abra a caixa!! Abra os portões!!” Em torno do 5° minuto! Sim, é ali que o baterista, Markos Franzmann, mostra seu valor com um lindo desenho de dois bumbos. Já o baixo, que não costuma ter tanta voz nesse estilo, aqui aparece desnudado.
Na era dos vídeos rápidos, nos tempos dos relacionamentos líquidos (onde temos a geração de jovens que menos se envolvem sexualmente – e isso não é algo positivo, por incrível que pareça), trazer num álbum a sonoridade que teve seu auge há 40 anos, aproximadamente, é um risco mas, antes de tudo, um desafio.
Bandas do estilo metal em geral têm trazido frescor, em diversos subgêneros, como Gojira, SpiritBox e o próprio Ghost. Mas o metal melódico, efervescido por fãs fiéis, ainda não teve sua grande renovação (que pensei ter sido em 2004 com “Temple Of Shadows”, Angra). Mas aqui temos, novamente saindo do Brasil, mais uma tentativa de renovação. Que venha o futuro!
Ouça Legends abaixo:
Muito interessante, parabéns 👏
Um texto rico, em todos os sentidos. Faz perceber como o universo da música é muito mais que gosto musical, é uma arte, esse texto me fez ver como a música pode ir muito além do que eu possa perceber
Ótimo texto, o universo da música é muito extenso, vários gêneros e gostos, anos 80/90 marcou muito, o som da banda em questão é bom, mas peca somente em parecer ser sempre a mesma batida.