Estreia discográfica à altura de um grupo que já nasceu com status de “super”
Por Luiz Athayde
Esse papo de supergrupo às vezes soa bem arrogante. Porém, há bandas que mesmo formadas sem tal intenção, já nascem com essa etiqueta. É o caso, obviamente, do Temic.
Vai vendo: banda de metal progressivo formada na Noruega pelo tecladista Diego Tejeida (ex-Haken, Devin Towsend, Mike Portnoy’s Shattered Fortress) e o guitarrista Eric Gillette (The Neil Morse Band, Mike Portnoy’s Shattered Fortress), mais o baterista Simen Sandnes (Shining, Arkentype) e o vocalista Fredrik Klemp (Maraton, 22).
Sentiu o drama? Currículo impecável, sim. Mas, como sempre, de nada adianta se as músicas não empolgam. Acontece que seu álbum de estreia, Terror Management Theory, lançado via Season of Mist, traz justamente os adjetivos empolgante e grudento.
Cortesia das composições com certo enfoque nas melodias vocais. Pode somar aí envolventes passagens intricadas movidas à jazz, funk, (synth) pop, mas sobretudo música eletrônica e suas infinitas possibilidades. Ah, sim: e heavy metal. MUITO metal.
Como todo disco que se proponha a abrir com uma introdução, “TMT” faz a honras para o primeiro petardo “Through the Sands of Time”. Inclusive essa ganhou videoclipe recentemente – um dos pontos altos do grupo está na estética sombria.
“Falling Away” por sua vez, sublinha o mote da banda: música extremamente elaborada, mas que cative o ouvinte nos seus primeiros segundos. Impossível não destacar a simbiose entre Bergensen e a cozinha extremamente entrosada; do seu começo apreensivo ao desfecho cinematográfico/apocalíptico.
A faixa seguinte é nada menos que “Count Your Losses”, óbvio cartão de visitas não somente do álbum, como do grupo. Música de pegada futurista (quase um Electronic Body Music com guitarras), enérgica, melodiosa. Realmente inspirada. Além de trazer uma letra digna de suspiros tanto para reis quanto para plebeus:
“Você se perdeu novamente / Agora você está correndo / pelas ruas da perda e da vergonha / Você estava se aproximando / da grande fuga / Mas você nunca se curará / se a dor que você causou o derrubou”.
Sem dar sinais de descanso, surge “Skeletons” com sua sonoridade remetendo vagamente ao prog metal dos anos 90, de nomes como Superior, Threshold (seminais nesse estilo) e Tad Morose. Entretanto, as nuances apresentadas nessa suíte ultrapassam limites de gênero, indo do lado mais funk do fusion ao universo alternativo.
Em “Acts Of Violence” o ouvinte tem a leve impressão que surgirá algo dançante pela intro dos teclados, mas não é o caso. O apreço é pelas ambiências outrora providas pelo space rock; aqui com um ar naturalmente contemporâneo e novamente carregado de energia – cortesia dos tempos e contratempos.
“Friendly Fire” vem ostentando ser a mais agressiva do disco. Não é ao acaso, tendo em vista que a banda não esconde suas influências de djent e do progressivo moderno capitaneado pelo Gojira e Devin Townsend. Fantástica.
As ambiências eletrônicas dão o tom da faixa seguinte, “Paradigm”, uma das mais pesadas e cativantes do registro. Sua pegada apresenta aquele clima sci-fi para servir de fundo para o constante existencialismo presente nos temas da banda.
“Once More” se sobressai como uma das mais palatáveis, por sua pegada direta e pelo seu flerte com o drum and bass. Ainda assim, há uma intervenção jazz/metal no meio da canção, antes de seguirem por um caminho quase celestial, de tão melódica.
E voltando a falar do espaço, o encerramento se dá a 63,3 anos-luz da Terra. “Mothallah” (título emprestado da estrela também conhecida como Alpha Trianguli) dramatiza a busca pela sobrevivência e a força interior quando o medo vem à tona.
Embora figure uma temática recorrente nas falanges de progressive metal, o Temic conseguiu fazer de um jeito que te abraça e lhe impede de pular uma faixa sequer.
Outro fator interessante em Terror Management Theory é que você tem a larga impressão de que está ouvindo uma banda formada há muitos anos, e que se trata de, sei lá, seu terceiro ou quarto trabalho. Se já fizeram isso tudo no primeiro, imagine no próximo.
Em suma, ouvir o debut dessa formação multicultural é também um alento ao saber que o progressivo se mostra renovado, especialmente por não se privar de explorar novos terrenos sonoros. Dito isso, esse é, tranquilamente, um dos melhores álbuns de 2023.
Ainda:
+ Terror Management Theory foi gravado no Top Floor Studios (bateria e vocais) em Gotemburgo, na Suécia por Jakob Herrmann, e teve produção assinada pelo Temic.
+ Jacob Umansky foi o baixista convidado no álbum.
+ Os corais em “Mothallah” contam com a participação do Mosaic Gospel Choir, da Noruega, e o Garden State Threshold, dos Estados Unidos.
+ Banda de RG nórdico, mas multiétnica: Diego Tejeida é mexicano, Eric Gillette, dos Estados Unidos, enquanto Simen Sandnes e Fredrik Bergersen são noruegueses.
Ouça Terror Management Theory pelo Bandcamp, ou a seguir: