Alemães enxugam o som e trazem a pegada mais direta dos primeiros discos
Por Luiz Athayde
Apenas três anos separam o último álbum do Blind Guardian de seu novo em folha, The God Machine, editado pelo carimbo Nuclear Blast.
No entanto, a sensação, para muitos, é que a linha temporal é bem maior. Isso se compararmos com o pomposo e igualmente excelente Twilight Orchestra: Legacy of the Dark Lands é, como o título diz, uma obra orquestrada.
Com isso, o próximo passo seria naturalmente uma das duas vias: seguir como uma espécie de continuação, ou retornar as raízes mais metálicas. Deu a segunda opção. Quem acompanha a carreira desta banda formada em 1987 – e outros tantos anos antes como Lucifer’s Heritage – sabe que evolução, por mais clichê que seja esse termo em muitos contextos, é uma constante em sua discografia.
A parte técnica do registro leva praticamente todas as assinaturas de gente da casa, ou melhor, no Twilight Hall Studios em Grefrath, Alemanha. Produção da banda, mais Charlie Bauerfeind, que além de ter seu nome ali no meio dos clássicos Battalions of Fear (1988), Follow the Blind (1989) e Nightfall In Middle-Earth (1998), carrega álbuns do Viper, Angra, Gamma Ray e muitos outros no currículo.
Já a mixagem ficou por conta do holandês Joost van den Broek (Epica, Powerwolf), e a masterização a cargo do finlandês Jaakko Viitalähde, mais voltado para nomes modernos do mercado de seu país. A engenharia sonora e a gravação também é de Charlie, juntamente com Thomas Geiger.
Só pelas credenciais, dá para se ter uma ideia da sonoridade, mas nada que se compare a audição em si. O play consiste em nove faixas enxutas, inclusive na duração das mesmas, com a finalidade de dar conta do recado em menos de 1 hora. E como deu certo. Tanto que surpreende logo no primeiro instante.
“Deliver Us From Evil” foi uma das músicas previamente compartilhadas com direito a videoclipe, e aqui toma de assalto os ouvidos que esperavam alguma introdução. A abertura é de suspense, mas depois, ‘pau dentro’: melodias grudentas de guitarra, vocais lá em cima e pedal duplo até o fim da Terra Média. Ou da próxima música; cortesia do time mais que entrosado formado por Hansi Kürsch, André Olbrich, Marcus Siepen e Frederik Ehmke.
Sem meias palavras, “Damnation” aparece ainda mais metálica, com a potência usual do grupo ao abordar passagens thrash, que aliás, é quase a máxima nesta faixa. Na sequência, aquela música que é o ponto necessário para pegar o fã sedento por refrão. E adianto que “Secrets Of The American Gods” (inspirada em ‘American Gods’, de Neil Gaiman) possui um dos melhores do catálogo dos alemães. Fantástico.
Em “Violent Shadows”, eles voltam para o viés speed/thrash com muito dinamismo nas passagens intricadas. De modo não tão distante, esta conversa tranquilamente com nomes como Megadeth e Forbidden. “Life Beyond The Spheres” começa flertando com a música eletrônica, mas apenas para dar um clima antes de explodir naquela vibe que o ouvinte deve simplesmente agradecer ao Led Zeppelin por ter criado “Kashmir”.
Faixa do meio rolando e nada de pisarem no freio, a não ser no refrão. “Architects Of Doom” cumpre bem esse papel, levando também em consideração que o jogo está ganho. Por outro lado, a balada “Let It Be No More” é outra composição que cativa em poucos momentos, ao trazer os corais típicos da banda, mas elevado à potências maiores.
Caminhando para o desfecho, “Blood Of The Elves” mostra que eles foram espertos não somente na quantidade de músicas, como no modo que montaram o disco. Para não perder o gás, engataram mais uma das rápidas, e nos melhores moldes do Tales From The Twilight World (1990).
Não seria nenhuma surpresa se revelassem que se trata de um outtake. Aqui o tema passa longe de O Senhor dos Anéis, e sim diretamente inspirado na série de livros The Witcher, do polonês Andrzej Sapkowski, que também ganhou série na Netflix.
“Destiny” encerra de forma cadenciada, apostando em mais melodia. E, de alguma maneira curiosa (ou não), ‘And The Story Ends’ se faz presente. Talvez pela métrica adotada ao compor o álbum.
No fim, o que importa é que estamos diante de uma fotografia de 2022 do power metal em sua essência; com dinâmica, coesão, melodias fortes e um bom senso fora de série, especialmente na era do Tik Tok. Nada contra músicas longas, muito pelo contrário, mas o cenário estava pedindo o Blind Guardian sendo curto e grosso, como dizemos aqui. Grande álbum.
Ouça The God Machine abaixo.
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